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Igor Mauler no JB: ajuste orçamentário na Prefeitura do Rio
11 de março de 2014
O sócio Igor Mauler Santiago falou ao Jornal do Brasil sobre possíveis ajustes orçamentários na Prefeitura do Rio de Janeiro.
Especialistas comentam jogo político de Eduardo Paes com garis
Prefeito terá que ajustar orçamento e pode ter que enfrentar greves de outras categorias.
O prefeito do Rio, Eduardo Paes, declarou no sábado (08/03), após o anúncio do reajuste de 37% do salário dos garis, que a prefeitura teria que se empenhar para promover um ajuste no orçamento e garantir o recurso. “Não sabemos como, mas a prefeitura vai fazer o esforço necessário”, disse. O mais provável, como reforçam especialistas no assunto, é que investimentos previstos sejam cortados. Mesmo assim, existe a possibilidade desses cortes não serem suficientes. Pior, outras categorias de servidores do município veem na vitória dos garis a chance de também conseguirem antigas reivindicações ainda neste ano. “Como dar o reajuste e preservar a Lei de Responsabilidade Fiscal?”, questiona o professor da Unicamp Francisco Lopreato sobre a possibilidade de novas manifestações de servidores do município.
O prefeito tentou evitar o movimento que pode surgir em breve. No sábado de manhã, disse enfaticamente que a Prefeitura não teria de onde tirar dinheiro, que se dependesse dele os garis ganhariam R$ 5 mil, mas que verba mesmo, não tinha. Com a importância do trabalho destes servidores e os efeitos da paralisação, junto com a repercussão no Brasil e no mundo, o prefeito cedeu. O impacto do reajuste na folha de pagamento anual da Comlurb é de R$ 400 milhões, passando dos atuais R$ 700 milhões para algo superior a R$ 1 bilhão, próximo ao orçamento geral deste ano da Companhia de Limpeza, que é de R$ 1,4 bilhão.
O impacto do reajuste no orçamento é grande, ressaltam especialistas. E os médicos do município, por exemplo, já planejam uma grande movimentação por um reajuste nos salários, conforme informou o presidente do Sindicato dos Médicos do Rio de Janeiro, Jorge Darze, ao JB. “A falta de diálogo e a omissão da prefeitura acabaram gerando uma atitude radical dos garis. Isso abre os olhos da população e desmascara o governo. O movimento dos garis acabou intensificando outros movimentos”.
Trata-se de uma briga política entre servidores públicos e o chefe da administração, traduz Francisco Lopreato, docente da Unicamp e revisor de periódico da Economia e Sociedade. “A partir do momento que os garis conseguiram esse aumento, que é muito significativo, isso vai certamente levar outras categorias a buscarem um reajuste também, vai gerar uma disputa de diferentes setores de trabalhadores da prefeitura, de não quererem ficar para trás. O prefeito sabe disso. Ele sabe que a grande questão não é o problemas dos garis. Esta categoria não é tão pesada, mas tem outras, então ele vai se ver em maus lençóis”.
Lopreato comenta que o orçamento anual tem limite, mas há possibilidade de remanejamento, para ficar dentro do limite estabelecido. O Paes certamente está pensando nisso, reforça, principalmente em ano de Copa e com a proximidade das Olimpíadas na cidade. “Na primeiro briga, ele diz que não cabe [o reajuste], depois aparece. Aparece como? Não tinha? Provavelmente não tinha numa rubrica, e ele vai ser obrigado a fazer algum remanejamento”.
O reajuste oferecido aos garis surpreendeu todo mundo, e muito, acredita Lopreato, e com isso, o prefeito acabou comprando uma briga com outras categorias. Embora o salário dos garis seja muito baixo. “Os médicos vão reivindicar em seguida, eles ganham muito pouco realmente, e acabam arrumando outras soluções. O Paes vai ter que se virar. Como dar reajuste e preservar o limite da Lei de Responsabilidade Fiscal”.
Leonardo Pessoa, jurista especializado em contas públicas, professor de Direito na FGV/RJ e no Ibmec RJ, ajuda a explicar as engrenagens do Orçamento Público. A Comlurb é uma empresa pública e tem orçamento próprio. Só que, quando suas necessidades ultrapassam o valor deste orçamento, sua sócia, que é a prefeitura, tem que passar um aporte.
“Certamente, isso vai ter um impacto. Pode ser que falte dinheiro para gasolina, manutenção dos caminhões da Comlurb”, comentou. Para que isso não ocorra, acrescenta, a prefeitura tem que aportar capital e evitar que a qualidade do serviço seja afetada. Como se trata de um ente público, precisa levar em conta um conjunto de leis orçamentárias, como o Plano Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA) – que fazem todo o programa de despesas e receitas do município. Todo o orçamento da Comlurb, então, já está previsto nessas três leis.
A prefeitura, então, realiza um aporte de capital através de um crédito adicional, previsto na lei N.° 4.320, que prevê, como explica Leonardo, as modalidades que podem ser implementadas pelo governante, como a necessidade de aprovação de alterações na lei orçamentária para a Câmara Municipal. O governante, portanto, calcula o que pode ser modificado no orçamento, que investimentos podem ser cancelados.
“Poderia ser questionado na justiça se o aumento é razoável, até mesmo pelo Ministério Público. A prefeitura fez o acordo no Tribunal Regional do Trabalho, então teve uma justificativa legal, jurídica”.
Leonardo ressalta a característica dos orçamentos anuais, tanto de entes públicos como o dos privados, de oferecer um equilíbrio entre receitas e despesas, como se estas fossem justificadas por aquelas, por uma questão contábil. “Só que aquilo é uma ‘foto’ do momento. O governo, quando prevê que a Comlurb vai dispender determinado valor, é uma previsão. Ela pode gastar menos ou mais. É normal solicitar modificações no orçamento ao legislativo para acobertar novas despesas. Isso pode ser feito, desde que seja através da lei”.
Logo, existe a urgência de um realinhamento das contas municipais. Leonardo acredita que essa mudança já deve ter sido ordenada na prefeitura e que em breve o legislativo municipal deve receber uma mensagem. A questão agora é, o que será cortado. “O cobertor é curto”, alerta. A reportagem entrou em contato com a assessoria de imprensa da Casa Civil da Prefeitura do Rio para receber informações sobre o corte do orçamento, mas não recebeu retorno até o fechamento desta matéria.
Igor Mauler Santiago, membro da Comissão Especial de Direito Tributário do Conselho Federal da OAB, esclarece que o prefeito tem duas opções. Uma menos provável, que é tentar reforçar a captação de receitas, como cobrança de IPTU, que tem uma inadimplência significativa, ou então, mais provável, atuar no controle das despesas.
“Caso não haja sobra [com o esforço na captação das receitas], duvido que haja, ele vai ter que contingenciar algumas despesas que não sejam inevitáveis. Com folha de pagamento não pode mexer, então o corte deve afetar algum investimento, como a construção de bens públicos, asfaltamento de ruas, algum projeto novo que tivesse contemplado. Essa vai ser sempre a luta do administrador público, que tem que lidar com uma infinidade de necessidades públicas”, destacou Santiago.
Em relação ao jogo político entre prefeitura e servidores públicos, ele reforça que, ao falar que não havia recursos e depois liberar um aumento salarial tão expressivo, Eduardo Paes “não necessariamente faltou com a verdade”.
O JB também entrou em contato com o Tribunal de Contas do Município, para receber um posicionamento, mas o tribunal alegou que se trata de uma questão administrativa fora de sua alçada.
“Levando em conta a importância da limpeza pública, para a saúde pública, o bem-estar, a estética da cidade, mil variáveis, foi preciso uma solução rápida. A prefeitura teve que buscar dinheiro em algum lugar, seja prevendo um esforço de aumento de arrecadação ou abrindo mão de algumas despesas não essenciais. Outra especialidade seria busca de empréstimo público, mas, normalmente, não se fala em empréstimo para custear despesas como folha de pagamento”, enfatizou Santiago.