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Conjur ressalta opinião de sócio sobre norma antielisiva
29 de março de 2011
O Site Consultor Jurídico publicou, no último sábado (26/3), matéria trazendo a opinião do sócio Igor Mauler Santiago em relação á norma antielisiva.
Norma antielisiva divide opiniões de tributaristas
Por Alessandro Cristo
Se o fisco tem reduzido o espaço para manobras das empresas no que se refere a planejamento tributário, o mau uso da legislação é o responsável, de acordo com advogados. Segundo alguns deles, a ideia de uma norma regulamentadora antielisiva, antes repudiada, pode vir a ser uma proteção contra abusos, ao substituir a subjetividade das fiscalizações por regras claras. Outros consideram que uma norma semelhante seria inconstitucional, já que proibir empresas de usar estratégias lícitas com o intuito de reduzir tributos violaria a livre iniciativa.
O assunto gerou debate na 10ª Conferência Anual sobre Planejamento Tributário, organizada pela International Business Communications, que reúne tributaristas de todo o país nestas terça e quarta-feiras (22 e 23 de março), em São Paulo. Nesta terça, o evento teve a participação do ex-secretário adjunto da Receita Federal, Marcus Vinícius Neder, que hoje é sócio do escritório Trech, Rossi e Watanabe Advogados, mas já esteve do outro lado do balcão. Neder foi o principal articulador do fisco por uma nova norma antielisiva, que regulamentasse o artigo 116, parágrafo único, do Código Tributário Nacional. Hoje, o dispositivo é a única regra à qual a Receita Federal se apega para multar em até 150% dos valores devidos companhias que dissimulem fatos geradores de tributação via elisão fiscal.
De acordo com o advogado Rubens Velloza, do escritório Velloza, Girotto e Lindenbojm Advogados Associados, a falta de precisão da legislação é uma das causas do grande número de autuações por planejamento tributário, o que tem gerado custo para as empresas. Em todos os casos envolvendo planejamento tributário desde 2003, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais da Receita Federal confirmou as autuações, segundo outro tributarista, o advogado Paulo César Vaz, do Vaz, Barreto, Shingaki & Oioli Advogados.
Velloza citou o caso de subsidiárias no Brasil de empresas estrangeiras, que além de terem de se defender administrativamente das multas, têm ainda o trabalho de reportar às matrizes detalhes das autuações, que por si sós já trazem a pecha de irregularidade. “As decisões do Carf são muito díspares devido à legislação mal-feita”, completou.
Diz o parágrafo único do artigo 116 do CTN que a autoridade administrativa poderá cobrar os tributos não pagos sobre operações ocultas por negócios jurídicos simulados. Segundo o tributarista Igor Mauler Santiago, sócio do escritório Sacha Calmon – Misabel Derzi Consultores e Advogados, o ato continua a valer no mundo jurídico, já que só o Judiciário poderia desconstituir um negócio, mas o fisco cobra o valor correspondente à real operação.
O problema é que o conceito de dissimulação tem sido usado para identificar toda e qualquer forma de elisão, mesmo as legítimas, segundo advogados. O Direito Civil — de onde o CTN importou a interpretação econômica de desconstituição de atos considerados nulos — prevê outros vícios possíveis nos atos societários, como o abuso de forma, o abuso de direito e a fraude à lei, “inaplicáveis ao Direito Tributário”, segundo afirma Santiago. Como apenas a dissimulação foi transposta para o Direito Tributário, os fiscais param no impasse: ou enquadram tudo nessa condição, ou não têm como autuar. A praxe, criticada pelos tributaristas, é levar a subjetividade ao limite extremo para classificar todas as estratégias como simulação.
“A motivação de reduzir tributos a pagar não é o que torna o planejamento ilícito, mas sim o caminho usado”, define Igor Mauler Santiago. Ele citou como exemplo a compra de títulos de CDB por empresas com créditos tributários acumulados. O procedimento, lícito segundo o advogado, consiste na compra de CDBs por empresas com créditos tributários cujo ressarcimento pela Receita demora, ou cujos débitos são menores que os créditos. A empresa então compra títulos prestes a vencer, tornando-se devedora do respectivo Imposto de Renda da operação. O IR devido é pago, via compensação, com os créditos tributários, e o valor dos CDBs é resgatado em dinheiro. A prática já foi condenada uma vez no Carf. “Não é sequer elisão, porque não há economia de tributo”, defende Santiago.
O advogado discorda da necessidade de uma norma geral antielisiva. “É desnecessária, já que 80% das autuações são contra simulação, tipificada no CTN.” Segundo ele, o uso do conceito para quase todos os casos é inconstitucional. “A tributação por analogia ofende a legalidade estrita, a segurança jurídica, a livre iniciativa e mesmo a separação dos Poderes, porque o administrador e o juiz arrogam função que somente o legislador pode exercer: a definição sobre a conveniência e a oportunidade das condutas do particular”, diz o advogado. “Onde não há simulação ou outra ilicitude, o propósito de economizar tributo é licito.” De acordo com ele, antes de pensar em uma nova norma, o fisco deveria esperar a jurisprudência se firmar nos tribunais superiores.
Segundo o ex-secretário adjunto da Receita Federal e sócio do Trech, Rossi e Watanabe, Marcus Vinícius Neder, ainda não há nenhum projeto de lei em andamento no Congresso, embora as discussões já aconteçam desde o ano passado. Ele concordou que a maior parte das autuações classifica os planejamentos como simulação, mas a quantidade de casos tem aumentado, e o Carf tem confirmado os lançamentos.
“Antes, as únicas punições eram em situações de pessoa interposta ou contratos de gaveta, até que a interpretação do artigo 149 do CTN passou a ser mais ampla”, diz. Ele se referiu ao enquadramento das chamadas operações “casa e separa”, segundo as quais, para escapar da tributação sobre a venda de um ativo, uma empresa compradora se torna sócia da vendedora temporariamente, por meio de um aporte de capital. No entanto, deixa a sociedade pouco tempo depois, levando o ativo, em vez do dinheiro.
Embora reconheça o subjetivismo das avaliações da Receita Federal quanto a negócios societários, ele afirmou que as multas têm sido aplicadas muito mais devido às provas colhidas do que pela interpretação teórica das possibilidades de enquadramento. O advogado Alexandre Nishioka, conselheiro do Carf e sócio do Wald e Associados Advogados, concorda. “O critério de análise é se o ato jurídico gerou atividade empresarial ou apenas uma ‘casca’ de sociedade”, diz. No critério de prevalência, a substância supera a forma. No entanto, segundo Neder, a discussão ainda não chegou aos tribunais regionais federais.
Para Rubens Velloza, as decisões do Carf têm se alinhado a favor do fisco, mas o Judiciário deve corrigir as distorções. “A Receita não pode interpretar o propósito do negócio. Se, em vez de cobrar o aluguel como pessoa física, eu crio uma empresa para receber os valores, o intuito é claramente o de pagar menos tributo, e isso não é ilegal”, afirma.