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Igor Mauler comenta tributação sobre a extração e circulação do petróleo
04 de janeiro de 2016
O sócio Igor Mauler Santiago foi ouvido pelo Jornal O Estado de São Paulo e pela revista eletrônica Consultor Jurídico sobre as novas leis fluminenses que tributam a extração e circulação do petróleo, confira:
Petroleiras ameaçam ir à Justiça para evitar aumento de impostos no Rio
ANTONIO PITA
Para contornar a grave crise financeira que já afeta diversos serviços públicos, o governo do Rio sancionou nesta quarta-feira, 30, último dia útil do ano, um conjunto de leis e decretos que ampliam os impostos para arrecadar R$ 5,6 bilhões em receitas extras no próximo ano. Entre as medidas, está a criação de uma taxa de fiscalização sobre cada barril de petróleo produzido no Estado. Outra medida amplia a incidência do ICMS sobre o petróleo desde a extração nos poços. Petroleiras multinacionais reagiram e ameaçam ir à Justiça contra os impostos, por considerá-los inconstitucionais.
“Esse é um momento de crise absoluta. Infelizmente temos de aumentar os impostos”, afirmou Júlio Bueno, secretário da Fazenda do Rio. As medidas foram publicadas nesta quarta no Diário Oficial do Estado e preveem mudanças nas alíquotas do ICMS sobre a comercialização do óleo diesel, que sairá de 12% para 14%, e também sobre a importação de determinados produtos. O governo também elevou o Imposto por Doação de Quaisquer Bens e Direitos (ITD), e ainda a alíquota do Fundo Estadual de Combate à Pobreza (FECP).
Para o setor de óleo e gás, uma das principais atividades econômicas do Estado, as medidas incluem a cobrança de ICMS pela circulação de óleo e gás e a taxação de cada barril produzido no Estado. Chamada de Taxa de Controle, Monitoramento e Fiscalização das Atividades de Pesquisa, Lavra, Exploração e Aproveitamento de Petróleo e Gás (TFPG), o tributo foi criado com a justificativa de “evitar danos ambientais irreversíveis” decorrentes da atividade petrolífera. Com a medida, cada barril de petróleo produzido no Estado será taxado em R$ 2,71 e o não pagamento acarretará em multa. Só com essa medida, o governo espera arrecadar até R$ 1,8 bilhão em 2016.
As mudanças nas regras de ICMS para o setor foram propostas pelo deputado Luiz Paulo (PSDB-RJ). Agora, o imposto passará a incidir sobre a “circulação de petróleo desde os poços de sua extração”. Hoje, o imposto incide apenas na comercialização de combustíveis. Com a nova medida, além da cobrança sobre a extração do óleo no poço, as empresas pagariam alíquota de 18% também quando a mercadoria circulasse em pontos de fiscalização. A expectativa é ampliar em R$ 100 milhões a receita mensal com a nova cobrança.
Tiro no pé. As regras entram em vigor em 90 dias. Até lá, o Instituto Brasileiro de Petróleo (IBP) tentará renegociar as medidas com o governo estadual, mas não descarta entrar com ações judiciais para barrar as novas cobranças. “No momento em que empresas e Estados buscam ser mais competitivos, o Rio vai na contramão. As medidas afetam decisões de investimento no curto e médio prazo que dependem de estabilidade regulatória”, afirmou o presidente do IBP, Júlio Camargo. “Criar um novo imposto no meio do caminho é um tiro no pé ou até mesmo na cabeça da empresa que vive um colapso de preços desde o último ano.”
Em nota, a Shell indicou que vê com “preocupação e descontentamento” as leis e avalia que há “indícios de inconstitucionalidade”. “A cobrança dessas taxas e tributos afeta contratos já firmados e projetos em andamento, com impactos significativos no equilíbrio financeiro de tais projetos. A medida também afeta a segurança jurídica necessária para o bom planejamento e a execução dos investimentos de longo prazo”, diz.
Para o advogado tributarista Igor Mauler, as medidas são inconstitucionais. No caso da cobrança de ICMS, a avaliação é que a extração de petróleo não consiste em uma operação comercial de venda. “Se não há operação de venda, transferência de propriedade, não há como cobrar. Não tenho dúvida que será derrubada”, diz Mauler. Ele lembra que, em 2002, o governo do Rio já foi derrotado judicialmente por propor cobrança semelhante. Quanto à taxa de fiscalização, o advogado a considera triplamente inconstitucional. “O princípio da taxa não é obter receita extraordinária, mas custear serviços públicos no seu exato valor.”
A Federação das Indústrias do Rio (Firjan) criticou as medidas. Em nota, a federação indicou que os novos tributos custarão aos cariocas, em média, R$ 269 a mais no próximo ano. “Aumentos e criação de novos tributos têm o potencial de agravar ainda mais a situação das empresas e do próprio governo, produzindo efeitos contrários aos desejados, podendo levar inclusive à queda da arrecadação”.
SURPRESA ONEROSA
Tributaristas criticam leis do RJ que aumentam arrecadação sobre petróleo
Por Marcos de Vasconcellos
Para aumentar a arrecadação do estado do Rio de Janeiro, o governador Luiz Fernando Pezão sancionou duas leis nesta quarta-feira (30/12) que oneram a extração de petróleo. Para isso, ressuscitou a cobrança do ICMS na extração, já prevista na Lei Noel (Lei 4.117/2003), alvo de ação direta de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal desde 2003. Além disso, instituiu uma taxa de fiscalização sobre a produção de petróleo, que, para especialistas, é triplamente inconstitucional.
A Taxa de Controle, Monitoramento e Fiscalização Ambiental das Atividades de Pesquisa, Lavra, Exploração e Produção de Petróleo e Gás, criada na Lei 7.128/2015, custa R$ 2,71 por barril produzido. Como o estado fluminense produziu 583.037.817 barris em 2014, segundo dados da Associação Nacional do Petróleo, a cobrança dessa taxa resultaria em um pagamento de R$ 1,58 bilhão para o Rio de Janeiro. No entanto, uma taxa só pode servir para financiar um serviço prestado, não para engordar os cofres públicos, alerta o tributarista Igor Mauler Santiago, do Sacha Calmon – Misabel Derzi Consultores e Advogados.
“Se o Estado gastar para fazer a tal fiscalização, tem o direito de criar uma taxa para repor essa despesa. Esse valor, no entanto, é manifestamente desproporcional, demonstrando uma finalidade arrecadatória, completamente inconstitucional”, explica Santiago.
Pedro Teixeira de Siqueira Neto, do Bichara Advogados, aponta que a quantia é tão elevada que poderia financiar toda a atividade da Secretaria de Estado de Meio Ambiente (orçamento de 2016 prevê despesas de R$ 1,38 bilhão). “Parece patente o ferimento ao princípio do não confisco, capitaneado no artigo 150, inciso IV, da Constituição Federal, bem assim à própria regra-matriz de criação das taxas (artigo 145, inciso II, da Constituição Federal)”, diz um parecer feito pelo escritório.
Outra inconstitucionalidade apontada é o fato de o estado fluminense querer fiscalizar algo que é de competência da União legislar. O artigo 22 da Constituição diz que compete privativamente à União criar leis sobre energia. “Quem legisla é que tem o poder para fiscalizar o cumprimento dessa lei”, afirma Igor Mauler Santiago.
Ainda na questão da competência, os advogados lembram que a maior parte do petróleo do Rio de Janeiro é produzido em plataforma continental, ou seja, o poder para fiscalizar a atividade é do Ibama, não do Instituto Estadual do Meio Ambiente (Inea). Assim, a taxa não pode ser paga ao Inea, uma vez que ele não tem nem sequer poder para fazer a fiscalização prevista na lei.
ICMS impossível
Quanto à cobrança de ICMS na produção de petróleo, a argumentação é ainda mais simples. O ICMS pressupõe transferência onerosa de titularidade de um bem. Quem extrai o petróleo, no entanto, torna-se seu proprietário originário, não seu comprador.
“A Constituição já fala que em energia elétrica e petróleo a cobrança do ICMS será no estado consumidor final. O Rio de Janeiro coloca como se houvesse um duplo fato gerador do ICMS, mas isso já foi declarado inconstitucional”, explica Siqueira Neto.
No entanto, os dois advogados afirmam que, por mais crivadas de inconstitucionalidade que as leis estejam, elas poderão gerar uma boa receita para o estado, uma vez que as decisões sobre inconstitucionalidades de taxas e tributos têm sido declaradas por tribunais com efeito ex nunc, ou seja, a partir do julgamento. Assim, tudo o que foi arrecadado até a data da decisão fica nos cofres públicos, e fora do bolso do contribuinte.